Brasil precisa atrair asiáticos

Por Chico Sant’Anna

A conjuntura internacional provocou uma alteração das principais rotas de turismo. Destinos tradicionais, como os Estados Unidos, registram quedas expressivas. Outras nações decidem adotar medidas como fim de vistos para atrair mais estrangeiros. O objetivo é conquistar uma parcela maior dos trilhões de dólares que os turistas movimentam. E o Brasil? Que medidas tem adotado?

Em 2024, a indústria do turismo movimentou mundialmente US$ 11,1 trilhões, um recorde histórico. Para esse ano, o Conselho Mundial de Viagens e Turismo (WTTC) espera um crescimento de 4%, mais US$ 450 bilhões. Esse crescimento, contudo, deve se dar em novos destinos. A conjuntura internacional tem reduzido a procura pelos locais tradicionais, em especial América do Norte, e o momento é oportuno para que o Brasil seja mais proativo e não deixe a oportunidade passar. Outras nações já estão se movimentando.

A política tarifaria norte-americana e a adoção de medidas contra estrangeiros por Donald Trump afetaram mais do que o comércio exterior. Elas mexeram com o fluxo internacional de turismo. A tensão política e econômica se complicou ainda mais com as guerras da Ucrânia e Rússia e Israel massacrando a Faixa de Gaza. Algumas fechando até o espaço aéreo para voos comerciais.

Turismo é mais do que as férias de verão. É uma parcela importante das receitas de muitos países. Mundialmente, espera-se para esse ano um crescimento da receita de turismo da ordem de 4%, a dúvida é onde esses viajantes vão abrir a carteira.

Não à toa, diversas nações estão implementando facilidades para atrair estrangeiros. O Irã, cujo o turismo representa 6% do Produto Interno Bruto (PIB), acaba de eliminar a exigência de vistos de turistas para uma série de nacionalidades, inclusive para brasileiros. A China foi pelo mesmo caminho e, a partir de 1º de junho não mais exigirá visto de brasileiros e de cinco nações sul-americanas. A ideia é manter o turismo como fonte importante de divisas. E o Brasil: que política tem adotado para atrair mais turistas estrangeiros?

Em 2024, o Brasil recebeu 6,657 milhões de estrangeiros. A terça parte do que a cidade de Barcelona recebe por ano. Foto: Geovana Albuquerque/Agência Brasília.
Turismo no Brasil

O fluxo de turismo no Brasil tem crescido, mas a taxas ainda são módicas para um país com o potencial como o nosso. Em 2024, o Brasil recebeu 6,657 milhões de estrangeiros. A terça parte do que a cidade de Barcelona recebe por ano.

Em 2024, turistas estrangeiros gastaram US$ 7,3 bilhões no Brasil, o melhor desempenho em 15 anos. A quantia, contudo, equivale à metade do que brasileiros gastaram no exterior: US$ 14,8 bilhões. Portanto, há muito o que fazer para equilibrar essa conta.

Do total de estrageiros que nos visitaram, cerca de dois milhões eram argentinos, que em grande parte, entram no país por rodovias. Os Estados Unidos ocupam a segunda posição, 696.512 turistas, chilenos vêm logo atrás, 651.776. Já os vizinhos Paraguai e Uruguai, juntos, somaram mais de 833.412 entradas no país. Ou seja, quatro em cada sete turistas estrangeiros são vizinhos provenientes das Américas, o que demonstra a necessidade de potencializar e diversificar a atração de turistas estrangeiros, focando, principalmente, nos asiáticos. Da Ásia, o maior fluxo de turistas proveio do Japão (57 mil) e Coreia (25,6 mil).

Anualmente, cerca de 150 milhões de chineses viajam ao exterior e injetam nas economias dos locais que visitam cerca de US$ 165 bilhões, equivalentes a quase R$ 1 trilhão. Números inimagináveis. Entretanto, muito pouco desses recursos, ou desses turistas, transitam em terras tupiniquins. Um incentivo poderia ser a adoção da política de reciprocidade pelo Brasil, isentando turistas chineses da obtenção de vistos. Recentemente, negociações bilaterais deram início à analise da possibilidade de um voo da China direto para Foz do Iguaçu. Além do local ser um dos preferidos dos turistas chineses, a região da Triplice Fronteira – Brasilm Argentina e Paraguai – concentra vários migrantes do país asiático.

Segundo o Financial Times, as maiores quedas se referem a viajantes provenientes da Áustria, Reino Unido, Suíça, Alemanha, Noruega e Espanha. Reino Unido e Islândia apresentam quedas superiores a 30%.
Redefinição de destinos

Internacionalmente, ocorre um rearranjo dos fluxos tradicionais de viajantes. A afluência de europeus aos Estados Unidos caiu, em março, 17% e a de caribenhos 16,7%, em relação ao mesmo mês de 2024. Grandes redes hoteleiras já registram queda de 25% em suas reservas. O menor interesse em viajar aos Estados Unidos decorre, de um lado, do medo das medidas xenófobas contra estrangeiros. A televisão mostra mundialmente a ação de uma polícia especializada contra estrangeiros, a “migra”, como chamam os hispânicos.

De outro, registrou-se uma reação de protesto contra o tarifaço norte-americano, que afetou as exportações e economias de todos os países. O jornal Financial Times informou que além de ocorrer uma queda em futuras compras de pacotes de turismo, turistas europeus estão cancelando viagens já compradas aos EUA, em retaliação às políticas de Trump. Segundo o Financial Times, as maiores quedas se referem a viajantes provenientes da Áustria, Reino Unido, Suíça, Alemanha, Noruega e Espanha. Reino Unido e Islândia apresentam quedas superiores a 30%. A mudança de planos pode afetar de maneira drástica a indústria do turismo estadunidense, que representa 2,5% do PIB.

Também na Europa, políticas governamentais que apertam a fiscalização da chegada de estrangeiros na chegada aos portos e aeroportos afeta o humor de quem deseja viajar para se divertir. Algumas cidades como Veneza, na Itália, e Barcelona, na Espanha, tem adotados medidas que obstacularizam a presença de turistas estrangeiros. Na chegada a países europeus, mulheres jovens e solteiras são os principais alvos da migração, pois são vistas como integrantes do fluxo do trafego humano, prostituição ou mesmo em busca de um casamento arranjado para arrumar uma nova nacionalidade. Esse cenário de crescimento do turismo internacional, de um lado, e de restrições de destino, de outro, se mostra estratégico para que o Brasil se apresente mais proativo na captação de turistas. Acrescente-se a isso a correlação do câmbio, que torna a presença da maioria dos estrangeiros mais barata no país.

Apesar da aproximação política das duas nações, da presença conjunta nos Brics, ainda é tímida a presença de chineses passeando pelas nossas cidades. Segundo dados oficiais, 291.261 turistas chineses entraram no Brasil entre 2018 e abril de 2025; média mensal de 3.309 pessoas.
Chineses: presença tímida

O Brasil já é fisicamente distante da China, uma viagem toma quase um dia. Se ainda tiver que enfrentar a burocracia e o pagamento de taxas, o turista chinês vai pensar duas vezes antes de escolher o nosso país como destino.

Apesar da aproximação política das duas nações, da presença conjunta nos Brics, ainda é tímida a presença de chineses passeando pelas nossas cidades. Segundo dados oficiais, 291.261 turistas chineses entraram no Brasil entre 2018 e abril de 2025; média mensal de 3.309 pessoas, contra os cinco milhões de chineses que viajam mensalmente ao exterior. No ano passado, melhorou um pouco, 70 mil turistas chineses visitaram o Brasil, um quantitativo ainda ínfimo de apenas 0,046% dos chineses que viajaram pelo mundo.

Sobre turismo de chinêses, leia também:

Brasil e Brasília querem atrair mais turistas chineses
Para bem receber os chineses, 333 agências de viagens brasileiras passaram por uma seleção e foram credenciadas pelo governo para recepciona-los. Entretanto, segundo o ex-secretário de Turismo do DF e ex-diretor de Marketing da Embratur, Geraldo Bentes, há um erro de foco por parte de grande parcela das agências. “Elas oferecem pacotes focados em praias, semelhantes aos ofertados a europeus e norte-americanos. Em 2008, nos reunimos com autoridades chinesas, e eles pediram tours focados em turismo rural, ecológico, cachoeiras, natureza. Houve até a sugestão, por parte deles, de organizar passeios para que os chineses acompanhassem a colheita e torrefação do café.”

Esse perfil de interesse parece ainda em vigor. Na recente Carta do Cerrado, elaborada pelos Ministros de Turismo dos países membros dos Brics, reunidos em Brasília, foi reforçado o compromisso do grupo com o turismo sustentável, regenerativo e inclusivo.

O Irã, que também eliminou a exigência de vistos para brasileiros, é uma incógnita não explorada pelo Brasil. Segundo a Embaixada do Irã, em Brasília, anualmente, cerca de 13 milhões de iranianos, dos 91 milhões de habitantes, viajam ao exterior. Poucos, contudo, são os que chegam até as terras de pindorama. De 2018 a abril de 2025, apenas 15.261 entradas de turistas iranianos foram registradas. É grande o potencial para um maior afluxo.

Países como Turquia, Tailândia, Malásia, Geórgia, Sérvia, Rússia e Azerbaijão já se deram conta da importância desses viajantes e estrategicamente passaram a flexibilizar os requisitos para que os iranianos os visitem. Passaportes iranianos estão entre os que tem mais restrições no mundo e tornar menos burocrática a viagem pode induzir na escolha de destino. A viagem Brasil Irã ainda depende de conexões em aeroportos de outros países. Tradicionais cias aéreas, como a Air France, Turkish e KLM voam regularmente para Teerã.

O Irã suspendeu a necessidade de visa para turistas brasileiros para estadias de até 15 dias. A embaixada acredita que uma medida recíproca por parte do Brasil poderia fortalecer ainda mais os intercâmbios entre as duas nações. Agências e operadores de turismo brasileiros também poderiam se beneficiar de novas abordagens para apresentar os dois países.
A isenção de visto de lado a lado, aliada à criação de voos diretos, é vista pelos iranianos como mola que pode impulsionar de forma significativa o turismo e as trocas comerciais entre Irã e Brasil.

“O Brasil é tão querido no Irã que, no sul do país, existe uma cidade chamada Abadan que é conhecida popularmente como o “Brasil do Irã” (a coluna verificou que até o time de futebol local se vale das cores da seleção canarinho). Como dois países amigos, com economias complementares, Irã e Brasil têm grande potencial para ampliar suas conexões. Um dos passos importantes para fortalecer essas relações bilaterais é a criação de oportunidades para que os povos se conheçam diretamente, sem intermediários. A isenção unilateral de visto turístico por 15 dias, concedida pela República Islâmica do Irã, representa uma dessas iniciativas” – comenta em nota Setor de Relações Públicas da Embaixada do Irã no Brasil.

Sobre o turismo no Irã, leia também:

Reportagem: Viagem ao “eixo do mal”
O Ministério do Turismo evita se posicionar em relação a eliminação de vistos para chineses e iranianos, dentro do princípio diplomático da reciprocidade. O mesmo que levou o Brasil a restabelecer vistos a norte-americanos e canadenses. “O fim da isenção é uma decisão da diplomacia do Brasil” – respondeu curtamente à coluna o MinTur. O Itamaraty, por sua vez, burocraticamente informou à coluna que “O governo brasileiro tomou nota da isenção unilateral de vistos para cidadãos do Brasil e de outros países sul-americanos em viagem à China por período de até 30 dias. Vinte países ou territórios concedem isenção de vistos ao Brasil, de forma unilateral, sem exigência de reciprocidade.”

O secretário de Turismo do DF, Cristiano Araújo, explica que a política de vistos busca equilibrar os interesses diplomáticos e o estímulo ao turismo, respeitando acordos bilaterais e as peculiaridades de cada relação internacional. Entretanto – diz ele – “independentemente de exigências de entrada, o Brasil mantém sua tradição de país receptivo, acolhedor e aberto ao intercâmbio cultural, econômico e turístico com todas as nações.”

O Irã guarda uma riqueza cultural imensurável. Persepolis (foto) um das antigas capitais do Império Persa é um dos sitios tombados pela Unesco como Patrimônio Cultural da Humanidade. Foto de Chico Sant’Anna.
Facilidades para turistas

A concessão de isenção de visto ou de facilidades especiais para turistas estrangeiros é uma prerrogativa soberana de cada país, mas no caso do Irã, a embaixada acredita que uma medida recíproca por parte do Brasil poderia fortalecer ainda mais as facilidades e os intercâmbios entre as duas nações.

Agências e operadores de turismo brasileiros também poderiam se beneficiar de novas abordagens para apresentar os dois países que, embora estejam geograficamente distantes do Brasil, mantêm uma relação amistosa com o país.

Como na Copa do Mundo de 2014 e nas Olimpíadas de 2016, realizadas no Brasil, e agora com a COP-30, em Belém, e a Copa de Futebol Feminino, em 2026, o país poderia aproveitar essa nova realidade do fluxo turístico internacional e adotar medidas mais corajosas para ampliar o turismo internacional. Isso se faz urgente para a economia nacional e mesmo para o posicionamento internacional de nosso país.

(*) Sou jornalista profissional, documentarista, moro em Brasília desde 1958. Trabalhei nos principais meios de comunicação da Capital Federal e lecionei Jornalismo também nas principais universidades da cidade. Ver todos os posts de Chico Sant’Anna

Nota de la Redacción: Usted puede leer esta nota en Español, Frances, Chino Mandarín e Inglés. Utilice el traductor de la página. 

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